Atos de junho: o legado dos protestos que começaram em 2013
Em 2015, estudantes secundaristas se inspiraram nos atos e ocuparam escolas contra reforma no ensino
Emanuelle Menezes
Fabio Diamante
Dez anos depois dos primeiros protestos de junho de 2013, uma pergunta persiste: qual foi o legado dos protestos que começaram em 2013? A resposta pode estar na rede pública de ensino de São Paulo. Inspirados na defesa dos direitos da população, jovens estudantes ocuparam escolas estaduais, em 2015, e impediram a reorganização escolar proposta pelo então governador Geraldo Alckmin (na época no PSDB). Os secundaristas ocuparam 213 colégios, em outubro daquele ano, pelo direito de estudar.
Jefferson da Cruz Baia, o Dimak, tinha 16 anos quando ocupou a Escola Joaquim Adolfo de Araújo, a "Corujinha", como é conhecida, na zona sul de São Paulo. Hoje, o adulto Dimak é um educador cultural.
"(A ocupação) Me fez mudar bastante, influenciou a ver a escola de outros olhos. Porque até então, nesse tempo, eu era como todo aluno era, ou é, hoje em dia: ia para a escola, porque não gostava, porque era obrigado pela mãe, ou porque tem que ir para a escola", diz ele.
O anúncio foi feito meses após uma greve de professores da rede estadual de São Paulo, que durou 92 dias e foi considerada a mais longa paralisação da categoria pela Apeoesp (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo) até aquele ano. Na esteira das manifestações que tomavam as ruas do país desde 2013, a proposta de Alckmin era um barril de pólvora.
"Absolutamente todos esses alunos das escolas públicas estavam ligados em junho de 2013, as manifestações estavam no radar deles. Então eles viveram isso, seja na rua, seja acompanhando na televisão, seja acompanhando nas redes sociais", afirma o cientista social Jonas Medeiros.
O governo do estado definiu a ocupação das escolas como um ato político e declarou que os alunos estavam depredando os prédios, mas não era bem assim. Nas redes sociais, eram publicados vídeos e fotos do que acontecia lá dentro. Eventos culturais foram organizados. Alunos limparam e pintaram escolas, muitas em péssimo estado de conservação. Na corujinha, não foi diferente. É o que conta o Dimak:
"A maioria das famílias, principalmente a minha, falava que isso era vandalismo, porque na TV mostrava... aí eu falava: caramba, dentro da escola, da ocupação, a gente tá limpando, lavando, pintando, reformando a escola o máximo que a gente pode, e estão falando justamente o contrário" - Jefferson Baia, o Dimak
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Para pressionar o governo, enquanto alguns alunos mantinham a ocupação, outros organizavam passeatas pela cidade. As ocupações duraram quase 3 meses e só terminaram, em dezembro, porque o governo cancelou a reforma. Uma vitória dos secundaristas.
O então jovem Dimak se formou no ensino médio e passou a escrever músicas e poesias, sua maior paixão. Hoje ele percorre escolas para incentivar alunos a encontrarem um caminho profissional.
"É uma coisa que eu amo, eu acho que muitas pessoas, muitos jovens, crianças, jovens hoje em dia, não sabem o que querem. Eu gosto de mostrar um leque de oportunidade, além do que a escola proporciona", diz ele.
Para Medeiros, que é integrante do Núcleo Direito e Democracia do Cebrap, Centro Brasileiro de Análise e Planejamento, as ocupações deixaram um grande legado de defesa da educação.
"É um grande legado, tanto em termos de culturas de direitos, foi muito surpreendente a existência de uma quantidade massiva de pessoas que estavam dispostas a dedicar 24 horas do seu dia, 7 dias por semana. Justamente para fazer uma defesa da escola pública", destaca o cientista social.
Foram diversas as lutas nos protestos que começaram há dez anos em todo o Brasil. De lá para cá, o preço da passagem voltou a aumentar e o passe livre ainda não é um direito de todos, embora a deputada federal Luiza Erundina (Psol-SP) tenha proposto um Projeto de Emenda à Constituição (PEC) para garantir o passe livre no transporte público de todo o país.
Apesar dos gritos de "não vai ter Copa", a Copa do Mundo de 2014 foi realizada no país. A Olimpíada de 2016, no Rio de Janeiro, também.
No campo político, esquerda e direita se alternaram no poder da Nação nesse período. Mesmo com a queda na popularidade causada pelos primeiros protestos, a presidente Dilma Rousseff (PT) conseguiu se reeleger em 2014. A esquerda saiu do poder, após o impeachment de Dilma e a posterior eleição de Jair Bolsonaro (PL), em uma ascensão da direita no campo político, mas retornou em 2023 com a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para um terceiro mandato.
Já a ocupação das escolas públicas, em São Paulo, teve um fim diferente. Com o fim da reorganização escolar, o resultado que entrou para a história foi a conquista dos estudantes.
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